Pular para o conteúdo principal

Será que vazamentos visam manifestação do domingo?

André Singer - Folha de S.Paulo

Sou avesso a teorias conspiratórias. Parto do princípio de que processos complexos, como os que vigoram na sociedade contemporânea, são sempre resultado de múltiplos fatores. Nenhum centro consegue controlar o conjunto deles.
No entanto, chamou-me a atenção o novo vazamento das declarações de Marcelo Odebrecht ao TSE em 1º/3 ocorrer às vésperas das manifestações programadas com o intuito de defender a Operação Lava Jato em 26/3. O estranhamento decorre de que o conteúdo principal do depoimento já havia sido divulgado, nos mesmos termos, quase um mês atrás.
Pode-se ler em "O Estado de S. Paulo" de 2/3/2017 o que Marcelo dissera ao ministro Herman Benjamin. Segundo o primeiro vazamento, Odebrecht afirmara que boa parte do doado pela empresa à chapa Dilma/Temer ocorrera por meio de caixa dois e "a petista tinha dimensão da contribuição e dos pagamentos, também feitos com recursos não registrados ao então marqueteiro do PT João Santana".
Agora, a mesma afirmação volta a ganhar enorme destaque, meramente porque a transcrição do que fora gravado em 1º/3 chegou a um site antipetista e, em seguida, a todos os grandes veículos de comunicação, no estilo do que foi apontado pela ombudsman da Folha (coletiva em off) no domingo (19). O lema jornalístico de que notícia velha não vende caiu em desuso?
Não se trata de diminuir a importância do supostamente revelado por Odebrecht. Ele fala de edição de medida provisória com expectativa de retribuição pecuniária, conversa sobre recursos com o então vice (hoje chefe de Estado), conhecimento da então presidente sobre pagamentos, para mencionar apenas alguns aspectos.
Embora não saibamos o que disso tudo está amparado por provas —sem as quais é apenas a palavra de um contra a palavra de outro—, reitero o que tenho dito e escrito: os personagens e instituições envolvidos precisam desde logo oferecer explicações detalhadas à opinião pública. Insistir no sintético bordão de que tudo foi feito dentro da lei é cada dia menos suficiente diante de relatos como o de Odebrecht. A exigência vale tanto para direita e o centro quanto, evidentemente, para a esquerda.
Compreendida a premissa acima, fica a hipótese de que o timing desses vazamentos esteja relacionado à necessidade de levar gente às ruas no domingo, como aconteceu em março de 2016 e acabou por ser decisivo para o sucesso do impeachment em abril do mesmo ano.
*


Não posso deixar de registrar que a aprovação na quarta (22) de um projeto de terceirização engavetado desde 2002 escancara o forte viés antitrabalho da maioria formada para derrubar a ex-presidente Dilma Rousseff.
http://www.blogdomagno.com.br/?pagina=4

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mapa das facções em presídios brasileiros

'Fi-lo porque qui-lo': aprenda gramática com frase histórica de Jânio Quadros

FI-LO PORQUE QUI-LO                       Vamos lembrar um pouco de história, política e gramática?                     O ex-presidente Jânio Quadros gostava de usar palavras difíceis, construções eruditas, para manter sua imagem de pessoa culta. Diz o folclore político que, ao ser indagado sobre os motivos de sua renúncia, em 1961, teria dito: "Fi-lo porque qui-lo".                     Traduzindo para uma linguagem mais acessível, mais moderna, ele quis dizer "fiz isso porque quis isso", ou, simplificando, "fiz porque quis".                     Esse "LO" nada mais é que o pronome oblíquo "O", que ga...

Vimos ou viemos à reunião?

Nós VIMOS ou VIEMOS à reunião? Muita gente tem dúvida na hora de flexionar o verbo VIR. Quer um exemplo: Como você diria: “Nós VIMOS ou nós VIEMOS à reunião?” A resposta é: depende. Sim, depende do tempo a que nos referimos. A forma VIMOS é do presente do indicativo. Por exemplo:  “VIMOS, por meio desta, solicitar..." (o verbo VIR está na 1ª pessoa do plural, no presente do indicativo); A forma VIEMOS é do pretérito, do passado. Exemplo: "Ontem nós VIEMOS à reunião." (o verbo VIR está também na 1ª pessoa do plural, mas desta vez no pretérito perfeito do indicativo). Muita gente evita usar o presente, porque a forma VIMOS é, também, o passado do verbo VER: "Nós o vimos ontem, quando saía do escritório".  Para não ter dúvidas sobre qual é o verbo que está sendo usado (o VIR ou o VER), ponha o verbo no singular. Veja: “VENHO, por meio desta, solicitar...” (essa é a 1ª pessoa do singular, em vez de VIMOS, 1ª do plural); “Eu o VI ontem, quando saía do escritório” (e...