Josias de Souza
O governo barrou um lote de verbas orçamentárias que já havia destinado a obras de interesse dos parlamentares. Os deputados fazem as contas. Alguns contabilizaram perdas de algo como R$ 10 milhões. Interpretaram a meia-volta como uma manobra para forçá-los a retornar ao Planalto com o pires na mão às vésperas da votação da segunda denúncia da Procuradoria contra Michel Temer.
É como se os operadores de Temer se inspirassem numa passagem de Brás Cubas, capítulo 36. O livro relata que Brás Cubas entra em casa e descalça as botas. Deita-se aliviado, com os pés em estado de bem-aventurança. O personagem conclui que as botas apertadas são uma das maiores dádivas da vida. Mortificando os pés, desmortifica-os depois, propiciando ao infeliz a felicidade suprema do descalçar.
Ao frear a liberação das emendas, o governo proporciona aos deputados o desconforto de uma bota apertada. Mas ensina aos infelizes que basta refazer o pedido e renovar seus compromissos com o futuro de Temer para usufruir do alívio da restituição das verbas.
Alguns aliados do presidente não gostaram do truque. Para derrubar a segunda denúncia, querem verbas novas, não uma renegociação de emendas antigas. Tem gente ameaçando mudar de lado, só para impor aos calos de Temer o desconforto de uma bota apertada.
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