Pular para o conteúdo principal

Previdência: reforma no lugar, resistências fora do lugar

Marcus André Melo – Folha de S.Paulo

Há forte resistência sobretudo entre partidos de esquerda à reforma da Previdência. Mas perderam o timing: ela deveria ter ocorrido em 2003. A bem da verdade, ela ocorreu de forma localizada: os parlamentares do PT que se opuseram à reforma foram expulsos do partido e criaram o PSOL.
A reforma da Previdência de 2003 (PEC 41/2003) foi a única, desde 1988, que não foi meramente paramétrica, mas estrutural. As reformas paramétricas envolvem apenas mudanças nos parâmetros do sistema: requisitos de idade, tempo de exercício no cargo, elegibilidades etc. Reformas estruturais, em contraste, envolvem mudanças mais gerais: a cobertura do regime, seu caráter público ou privado (e o lugar da previdência complementar privada), o regime de contribuição (se com contribuição ou benefício definido), a forma de financiamento (capitalização versus repartição) etc.
A PEC 41/2003 teve impacto estrutural: estipulou que os novos servidores públicos não teriam mais aposentadoria integral. Para esses, a reforma previa inicialmente o teto do INSS como valor máximo de aposentadoria. Quem quisesse ganhar mais teria de contribuir com os fundos de previdência complementar (em regime de contribuição definida). Quanto menor o teto, maior o mercado de fundos previdenciários. Mesmo as entidades públicas podem contratar agentes privados para gerenciar o sistema. Demorou nove anos até que o Funpresp fosse regulamentado.
A reforma de 2003 também completou a reforma paramétrica de FHC, que ficara incompleta. A taxação de servidores inativos, julgada inconstitucional pelo STF, por exemplo, foi reapresentada e aprovada. Idem idade mínima para servidores.
O que é paradoxal é que essa reforma foi aprovada por um governo que a combatera acirradamente. Analistas diversos como Rodrik, Cukierman e Tommasi chamaram atenção para esse fato estilizado e seu argumento passou a ser conhecido como "Why it takes a Nixon to go to China?" ("Por que só um Nixon pode ir a China?"). A lógica é: só um anticomunista "durão" ("hawk") como Nixon pode iniciar uma abertura para a China sem ser acusado de estar capitulando ou transigindo com o adversário. Da mesma forma, presidentes de esquerda podem aprovar reformas pró-mercado (setores de esquerda dirão "se vem deles, deve fazer sentido" e ele contará com os votos da esquerda e da direita).

De fato, Lula contou com o apoio massivo do PSDB para aprovar a reforma. O preço político de reformas desse tipo vem depois e são muito maiores que a defecção de correligionários. Elas contribuíram para o desgaste do PT enquanto "marca partidária". E mais: a incongruência promessas vs. políticas torna a política ininteligível e cínica para os eleitores.
http://www.blogdomagno.com.br/?pagina=2

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Mapa das facções em presídios brasileiros

'Fi-lo porque qui-lo': aprenda gramática com frase histórica de Jânio Quadros

FI-LO PORQUE QUI-LO                       Vamos lembrar um pouco de história, política e gramática?                     O ex-presidente Jânio Quadros gostava de usar palavras difíceis, construções eruditas, para manter sua imagem de pessoa culta. Diz o folclore político que, ao ser indagado sobre os motivos de sua renúncia, em 1961, teria dito: "Fi-lo porque qui-lo".                     Traduzindo para uma linguagem mais acessível, mais moderna, ele quis dizer "fiz isso porque quis isso", ou, simplificando, "fiz porque quis".                     Esse "LO" nada mais é que o pronome oblíquo "O", que ga...

Vimos ou viemos à reunião?

Nós VIMOS ou VIEMOS à reunião? Muita gente tem dúvida na hora de flexionar o verbo VIR. Quer um exemplo: Como você diria: “Nós VIMOS ou nós VIEMOS à reunião?” A resposta é: depende. Sim, depende do tempo a que nos referimos. A forma VIMOS é do presente do indicativo. Por exemplo:  “VIMOS, por meio desta, solicitar..." (o verbo VIR está na 1ª pessoa do plural, no presente do indicativo); A forma VIEMOS é do pretérito, do passado. Exemplo: "Ontem nós VIEMOS à reunião." (o verbo VIR está também na 1ª pessoa do plural, mas desta vez no pretérito perfeito do indicativo). Muita gente evita usar o presente, porque a forma VIMOS é, também, o passado do verbo VER: "Nós o vimos ontem, quando saía do escritório".  Para não ter dúvidas sobre qual é o verbo que está sendo usado (o VIR ou o VER), ponha o verbo no singular. Veja: “VENHO, por meio desta, solicitar...” (essa é a 1ª pessoa do singular, em vez de VIMOS, 1ª do plural); “Eu o VI ontem, quando saía do escritório” (e...