Vinicius Torres Freire – Folha de S.Paulo
Conversar com deputados dá uma sensação de irrealismo agoniado, ainda mais neste clima de últimos dias de paupérie, de começo de fim de governo na pindaíba, em que todo o tempo é consumido por arranjos da eleição, clima de Terça-Feira Gorda, "é hoje só", de últimos dias da liquidação de votos na bacia dos lobbies.
A conversa é sobre reforma da Previdência. O irrealismo é do jornalista, que trabalha em São Paulo e, mesmo depois de décadas neste serviço, ainda não se habituou à ideia de Brasília.
Os deputados são de um realismo chão, nu e cru: estão com a maioria dos eleitores, contra a reforma. Dizem que já deram sua cota de sacrifício, por assim dizer: teto de gastos, reforma trabalhista, "injustiças" da Lava Jato.
Não tiveram retorno em termos de popularidade, emendas e prebendas.
Sim, é simples assim, sempre foi. A leitora, que é perspicaz, sabe. Mas ainda é estranha a atitude impassível quanto ao risco de ruína lenta, segura e gradual, daqui a uns dois anos.
As conversas são com parlamentares de quatro partidos do centrão e do PSDB, embora a distinção entre centristas e a maioria dos tucanos pareça borrada. Os deputados parecem inamovíveis, indiferentes à sugestão de futuro próximo sombrio. Dizem que não vai ter voto pela reforma.
Disseminou-se uma conversa que apareceu na última quinzena, quando o governo mudou sua "estratégia de comunicação", sua propaganda.
Quase todo deputado conta a mesma história: é preciso esperar o efeito da campanha governista, ver se o povo compra a reforma, confirmação que vai demorar, dizem. Portanto, apenas em fevereiro os deputados poderiam pensar em mudar seu voto
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Os deputados têm o receio óbvio de perder a reeleição, notório desde abril, gritante depois de maio, quando se associar ao Michel Temer dos escândalos e das reformas se tornou o beijo da morte na urna. Nesta semana, porém, eram mais notáveis também os comentários sobre a situação dos servidores.
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Os deputados têm o receio óbvio de perder a reeleição, notório desde abril, gritante depois de maio, quando se associar ao Michel Temer dos escândalos e das reformas se tornou o beijo da morte na urna. Nesta semana, porém, eram mais notáveis também os comentários sobre a situação dos servidores.
Há pressão política, sindical, mas também simpatia genuína, digamos, e interesse familiar e de grupo. A parentela parlamentar tem montes de servidores; amigos e eleitores especiais da "base" são funcionários.
O PSDB, que há 20 anos ainda parecia o "partido das reformas", negocia emendas para favorecer servidores federais admitidos antes de 2003, os trabalhadores com as aposentadorias mais privilegiadas do país, quiçá do planeta. O adiamento do reajuste dos servidores, parte do pacotinho fiscal de agosto, também está para mergulhar no vinagre.
No mais, o clima, ressalte-se, é de Terça Gorda, "é hoje só": no ano que vem, quase não tem mais governo ou votação importante. Deputados querem ficar bem com ruralistas, concedendo-lhes perdão de dívidas previdenciárias, e com pequenas e microempresas, para quem haverá Refis. Etc.
Pode passar alguma coisa? Rodrigo Maia, presidente da Câmara, volta a se embevecer com a ideia de suceder Temer. Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, começou a campanha para valer. Temer quer ter algum controle sobre sua sucessão e seu foro em 2019. O trio pode fazer mágicas e milagres a fim de aprovar alguma coisa. Mas o clima em Brasília é de realismo nada fantástico.
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