Blog de Josias de Souza
Sergio Moro declarou no início do ano que a ''Lava Jato não é seriado de TV, que tem que ter capítulo toda semana.'' Hoje, porém, a operação produz capítulos numa profusão típica de novela diária. A plateia, cada vez mais familiarizada com os personagens, aplaude o desempenho do juiz-protagonista e dos coadjuvantes do núcleo de investigação. Vibra com as prisões de Cunhas e Paloccis. E se diverte com o núcleo de figurantes da Polícia Federal, cujo papel parece ser o de injetar uma dose de comédia na tragédia.
Nos últimos dias, descobriu-se que Newton Ishii, o ‘Japonês da Federal’, livrou-se de sua tornozeleira eletrônica mais cedo do que o previsto. Tomado pela ficha funcional, Ishii está mais próximo dos vilões que escoltou até a carceragem de Curitiba do que do quadro de servidores da PF. Em 2003, foi preso por colegas acusado de facilitar a entrada de contrabando na fronteira com o Paraguai. Amargou dois meses de cana. Condenado, recorreu.
Ishii saiu da PF e reintegrou-se à instituição. Em março passado, o STJ confirmou sua condenação: quatro anos e dois meses de cadeia, no regime semiaberto. Ganhou tornozeleira. Mas não perdeu o emprego. Aliviou o tornozelo porque, a cada três dias de expediente na PF, subtraiu um dia com o adereço eletrônico.
No Carnaval, as máscaras de Ishii fizeram concorrência às de Sergio Moro. Depois da condenação, a diversão confundiu-se com avacalhação. Súbito, o departamento de figurantes da PF escalou outros agentes para conduzir os vilões da Lava Jato até a República de Curitiba. Nesta semana, irrompeu em cena Lucas Valença, uma mistura de ‘hipster’ com lenhador. Virou subcelebridade instantânea depois de conduzir Eduardo Cunha pelo braço. Bombou no Facebook e no Instagram, onde aparece de torso nu. O sucesso levou-o a veicular um vídeo neste sábado. Termina assim:
''Queria agradecer a todo mundo que está seguindo e mandando mensagem de apoio, de carinho, e dizer que, realmente, estou honrado de ter participado desse momento histório. É isso aí. Valeu.''
Pessoas que fazem história nem sempre têm uma sensibilidade à altura dos seus feitos. Ou têm, mas não conseguem expressá-la. Considerando-se a frequência com que o departamento de figurantes da PF vem roubando (ops!) a cena na Lava Jato, o comando da institução deveria reservar uma verba para a contratação de dublês.
Assim como existem os dublês que substituem os atores nas cenas de perigo, deveria haver intelectuais para substituir os agentes da figuração na hora de expressar emoção. Eduardo Cunha está longe de ser o detento mais importante da novela. Prisões mais notáveis estão por vir.
No quesito aparência, o Lenhador da Federal cumpre bem o seu papel. Mas há momentos em que a boa frase é essencial. De duas, uma: ou a PF restabelece a compostura, devolvendo o setor de figurantes à insignificância de praxe, ou providencia alguém com menos tórax e mais reflexão para substituir o lenhador na hora em que ele tiver que se deslumbrar com os grandes momentos que estão por vir.
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