Lula visita obras do Itaquerão com o ex-presidente do Corinthians Andrés Sanchez e Emílio Odebrecht (à direita)
Folha de S.Paulo - Mario Cesar de Carvalho
A Lava Jato vai chegar ao Corinthians. Emílio Odebrecht, presidente do conselho de administração do grupo que leva o seu sobrenome, afirmou em acordo de delação, em fase de negociação, que o estádio construído pela empreiteira foi uma espécie de presente ao ex-presidente Lula, torcedor do time. O agrado, na versão de Emílio, foi uma retribuição à suposta ajuda de Lula ao grupo nos oito anos em que o petista comandou o país, de 2003 a 2010.
Sob governos do PT, de 2003 a 2015, o faturamento do grupo Odebrecht multiplicou-se por sete, de R$ 17,3 bilhões para R$ 132 bilhões, em valores nominais (a inflação do período foi de 102%).
Emílio é pai de Marcelo Odebrecht, preso desde junho de 2015 e condenado a 19 anos de prisão. Por pressão do patriarca, ele e cerca de 80 executivos do grupo decidiram buscar um acordo de delação premiada.
Os relatos, que indicam suborno, ainda terão de ser homologados pela Justiça.
Emílio passou a integrar o acordo porque era o principal interlocutor de Lula.
Foi o mais ardoroso defensor da delação, vista por ele como a única saída para salvar o grupo da falência.
Após a prisão de Marcelo, a Odebrecht passou a ter problemas de crédito com bancos e acumula dívidas de R$ 110 bilhões.
Conhecida como Itaquerão, a arena do Corinthians, na zona leste de São Paulo, foi construída pela empreiteira de 2011 a 2014, quando foi palco da abertura da Copa do Mundo. Custou R$ 1,2 bilhão, quase 50% acima da estimativa inicial do projeto, de R$ 820 milhões.
A obra foi financiada por recursos do BNDES (R$ 400 milhões), títulos autorizados pela Prefeitura de São Paulo (de até R$ 420 milhões) e empréstimos em bancos privados. Na época, o prefeito era Gilberto Kassab (PSD).
A ideia de construir o Itaquerão partiu do então presidente Lula, que atribuía os maus resultados do Corinthians à falta de um estádio, segundo relatos colhidos pela Folha.
Em 2010, o último ano de Lula à frente da Presidência, o clube ficou em quinto lugar no Campeonato Paulista, terceiro no Brasileiro e nono na Libertadores. Em 2007, havia sido rebaixado.
O presidente do clube à época, o atual deputado Andrés Sanchez (PT-SP), já havia dito em 2011 à revista "Época" que Emílio participara do projeto financeiro da arena: "Quem fez o estádio fomos eu e o Lula. Garanto que vai custar mais de R$ 1 bilhão. Ponto. A parte financeira ninguém mexeu. Só eu, o Lula e o Emílio Odebrecht".
O resultado da equação financeira montada foi desastroso. Dos R$ 420 milhões de títulos com emissão autorizada pela prefeitura, que poderiam ser usados para quitar dívidas municipais, foram vendidos R$ 25 milhões.
O Corinthians não tem pago as parcelas mensais de R$ 5,7 milhões ao BNDES, com o consentimento da Caixa, que intermediou o empréstimo, porque negocia uma carência maior.
A arena deveria ter arrecadado R$ 112 milhões no ano passado, mas conseguiu R$ 90 milhões. Se o desempenho se repetir nos próximos anos, o Corinthians pode perder o estádio para a Odebrecht, segundo contrato do clube e um fundo que cuida do empreendimento.
REUNIÕES
Além do caso do estádio, Emílio relata na proposta de acordo de delação que tinha reuniões com Lula, muitas vezes com frequência mensal.
Nesses encontros, Emílio pediu e obteve o aval de Lula para ajudar a empreiteira a se expandir por América Latina e África.
O petista é réu numa ação que tramita em Brasília, sob acusação de ter ajudado a Odebrecht a conquistar contratos em Angola.
Lula preferia tratar dessas questões com Emílio, segundo executivos ouvidos pela Folha sob condição de anonimato, porque não gosta do estilo seco de Marcelo. Tinha afinidade com o modo descontraído do baiano Emílio.
Nos encontros entre Lula e Emílio, não eram mencionados pagamentos de suborno, ainda na narrativa dele.
As questões práticas de como o PT seria beneficiado pela ajuda à Odebrecht seriam tratadas entre Marcelo e o ex-ministro Antonio Palocci.
O ex-ministro aparece com o codinome de "Italiano" em documentos apreendidos pela Polícia Federal no que seria o "departamento de propina" da Odebrecht, mantido em Salvador, segundo os procuradores da Operação Lava Jato e a ex-secretária da empresa Maria Lúcia Tavares, que fez um acordo de delação.
OUTRO LADO
O advogado Cristiano Zanin Martins, que cuida da defesa do ex-presidente Lula, desqualificou o conteúdo das delações negociadas na Operação Lava Jato, como a de Emílio Odebrecht, executivo do grupo que leva seu nome.
"A Lava Jato não conseguiu apresentar qualquer prova sobre suas acusações contra Lula. Na ausência de provas, trabalha-se com especulações de delações. Se a delação já não serve para provar qualquer fato, a especulação de delação é um nada e não merece qualquer comentário", disse o advogado em nota enviada à Folha.
A Odebrecht, o Corinthians e o deputado Andrés Sanchez não quiseram comentar o relato de que o estádio do time seria um presente para Lula pela suposta ajuda ao grupo.
O advogado José Roberto Batochio, que defende o ex-ministro Antonio Palocci, diz que a afirmação de que o seu cliente tratava de suborno com Marcelo Odebrecht não tem fundamento.
"Causa surpresa essa versão de que o Palocci tinha mais contato com o Marcelo do que com o Emílio Odebrecht. Porque há uma amizade muito antiga entre Palocci e Emílio. Ele consultava muito o Palocci sobre a economia nacional e global. Já a relação entre Palocci e Marcelo era quase zero."
O defensor rebate a interpretação dos procuradores da Lava Jato e da Polícia Federal de que o ex-ministro seja o "Italiano" citado em planilhas da Odebrecht. Segundo ele, as próprias mensagens trocadas por executivos mostram que Palocci jamais poderia ser o beneficiário dos supostos subornos
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